quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

O causo do anjo da cantina do Frei Uomo


O causo  do Anjo da cantina do Frei Uomo

Frei Uomo tinha uma pequena vinha plantada, e dela, todos os anos colhia os frutos e produzia o vinho que utilizava durante o ano, tanto nas missas, quanto para uso pessoal, e nos encontros com os amigos. 
Para as missas, deixava guardado o vinho puro. Para os amigos, misturava açucar e um pouco de cachaça, porque o que interessava era a tonturinha que dava e não tanto o sabor, e de "bouquet" nem passavam perto de saber do que se tratava. Desta forma, fazia render o vinho. Costume que não é diferente nas casas de café colonial que servem o famoso "vinho de missa" à vontade junto com os petiscos.  O que não contam é que a "cantina da casa" fica ali atrás, na cozinha, onde pegam vinho de garrafão e adicionam melado com água e corante, que não faz nenhum mal e até deixa mais docinho o tal vinho.
Pois bem. Numa certa noite, já altas horas, o Frei acordou com o latido dos cuscos. Fez silêncio para ouvir melhor, e resolveu levantar sorrateiro para ver do que se tratava. Foi lá fora e não viu nada. Olhou para os lados, para longe, para o céu, e nada. Noite limpa, céu claro, um friozinho costumeiro, mas havia algo estranho. Os cuscos não latiam por latir. Um bicho, talvez uma raposa. Não o galinheiro estava em silêncio. Aí deu um estalo: a cantina!
Meteu a mão na sua velha pinga fogo, pegou um lampião e foi devagarinho até a cantina. A porta estava destrancada. Entreo com cuidado, engatilhou a espingarda e berrou:
-Quem tá aí?
Silêncio. Gritou novamente:
-Fala quem tá aí senão eu hei  de lhe pregar  fogo!
Uma voz trêmula saiu do fundo de uma pipa:
- Sô ieu, padre!
O Frei arregalou o olho e em posição de aletra berrou?
-"Ieu" quem, desgramado? Fala logo, porque vai tomar tiro de sal na bunda! Rogo-lhe as pragas apocalípsias de arremate!
A voz embargada, apavorada diante da ameaça, que muito comumente era aplicada aos piás malevas que roubavam frutas nos pomares, e no dia seguinte apareciam mancando pra Carsulina aplicar um cataplasma, onde eram denunciados pelo ferimento humilhante, balbuciou baixinho e com doçura:
-Sou um Anjo, padre....
O Frei deu um sorriso discreto e malicioso e percebeu tudo, mas continuou com a farsa:
-Se for um Anjo de verdade, então voa pra eu ver!
A voz já aos prantos e humilhada respondeu de pronto:
-Num posso avoá, padre. Sô só um fiotão!
No dia seguinte bem cedo, Carsulina preparava um cataplasma para aplicar no Birruga.

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